Fomos convidados a viver o chamado Ano da Fé, como forma de
rememorar as orientações do Concílio Vaticano II (1952-1965), que nos convida a
ser Igreja de modo a atender às necessidades da realidade de hoje. Muitos
sentem que as comunidades católicas ainda não conhecem suficientemente o que
foi proposto pelo Concílio há cinqüenta anos. A catequese pode ajudar a sanar
essa deficiência, lembrando constantemente frases que iluminam o caminho que o
Concílio nos quis mostrar. Se, a cada encontro catequético, se destacasse uma
citação de documentos importantes desse evento, poderíamos ir criando inclusive
uma curiosidade que capaz de levar os catequizandos adultos a buscar um
conhecimento pessoal maior daquilo que a Igreja quis nos comunicar nesses
cinqüenta anos.
Quando
penso no Vaticano II, a primeira coisa que me vem à mente e ao coração são as
frases iniciais da Constituição Pastoral Gaudium et Spes, sobre a Igreja e
o mundo de hoje. É um documento que começa assim:
“As
alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje,
sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as
esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo. Não se
encontra nada verdadeiramente humano que não lhes ressoe no coração.”
E
o primeiro número desse documento se completa dizendo: “... a comunidade
cristã se sente verdadeiramente solidária com o gênero humano e sua história.”
O
Concílio está falando de uma solidariedade total, sem exclusões. Está vendo a
Igreja interessada em toda a família humana, não como um grupo que cuida só dos
seus. É uma Igreja totalmente a serviço, envolta numa grande comunhão com as
necessidades de todos os filhos de Deus. Isso pode não parecer uma declaração especificamente
ecumênica, mas combina muito com o próprio significado da palavra “oikoumene”,
que significa casa habitada, a casa planetária de todos nós. Se todos os
cristãos estiverem de fato solidários diante das alegrias e esperanças,
tristezas e angústias de todos os filhos de Deus, vão perceber mais depressa
que os discípulos de Cristo precisam estar unidos porque esse é um programa de
trabalho missionário que, além de ser amplo demais para cada Igreja realizar
sozinha, está acima das nossas diferenças doutrinárias.
O
mesmo documento, lá pelo número 22, vai falar da luta contra o mal
como uma necessidade do cristão que, associado ao mistério pascal, chegará à
ressurreição, grande vitória da vida. Mas aí faz questão de acrescentar algo
que seria ainda hoje novidade para muitos católicos:
“Isso
vale não somente para os cristãos, mas também para todos os homens de boa
vontade em cujos corações a graça opera de modo invisível. Com efeito, tendo
Cristo morrido por todos e sendo uma só a vocação última do homem, isto é
divina, devemos admitir que o Espírito Santo oferece a todos a
possibilidade de se associarem, de modo conhecido por Deus, a esse mistério
pascal.”
Ao
comunicar tais afirmações , a catequese estaria ajudando bastante a Igreja a
ter uma imagem bem mais atraente para os de fora e mais mobilizadora para a
prática da caridade entre os de dentro. Além disso, daria um grande consolo às
famílias que têm , entre seus membros mais amados, pessoas que não se identificam
como cristãos.
Alguém
poderia dizer: isso não seria um estímulo a deixar tudo como está, sem maiores
envolvimentos no trabalho missionário que quer formar novos discípulos de
Cristo? Nenhum reconhecimento da presença implícita e ainda não reconhecida da
graça de Deus na vida de uma pessoa nos dispensa de oferecer a ela o maior
presente que uma pessoa pode acolher: a descoberta desse amor imenso
demonstrado pela vida e morte de Jesus, a riqueza da mensagem do evangelho,
destinada a nos impulsionar na construção de um mundo novo. Mas olhar para o
outro como alguém que já tem em seu coração a graça operando de maneira
invisível vai dar um tom diferente ao nosso diálogo com essa pessoa. Isso nos
coloca num caminho de acolhimento, sem o qual qualquer anúncio do evangelho tem
muita chance de ser mal recebido.
A
catequese formará evangelizadores muito mais convincentes se os educar nesse
espírito de sensibilidade para as situações que as pessoas vivem e para essa
presença, muitas vezes ainda não percebida, da graça de Deus na vida de quem já
está atraído para o bem mas ainda não se identificou como cristão.
Therezinha Cruz
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